quinta-feira, 10 de abril de 2008

O "acriana" de Zuenir

Ainda no estágio recebo um convite de uma amiga para participar de um bate-papo com o escritor e jornalista Zuenir Ventura. Como tinha lido um dos seus livros, “Chico Mendes – Crime e Castigo”, a pedido do professor da faculdade, achei que seria importante estar presente para discutir alguns pontos sobre o livro e de quebra fazer um “h” com o professor. Saímos do estágio e fomos ao encontro de Zuenir.
Ao chegarmos percebemos que estava vazio e o Zuenir ainda não estava por lá. A expectativa de encontrá-lo aumentava a cada instante. Quando ele chegasse o que faríamos? Assumiríamos a nossa pose de tiete e pediríamos um autógrafo? Mas antes como iríamos reconhecê-lo, se nunca o tínhamos visto antes?A verdade é que todo senhor de cabeça branca que passava com um ar de intelectual ficávamos com a dúvida de ser ele ou não.
Entretanto, a nossa referência construída não iria nos ajudar muito, afinal era quase impossível não achar pessoas que não se encaixassem nesse perfil. As apostas eram altas e achar o Zuenir ficava uma tarefa cada vez mais difícil. Até que uma figura vestida de preto aparece e facilmente se encaixa no perfil pré-estabelecido. O tumulto a sua volta validava as nossas suspeitas.
“Olha o cara aí”, pensei. Só poderia ser ele, quem mais iria estar rodeado de pessoas e com um ar de intelectual pós-moderno? Na discussão com minha amiga de quem iria abordá-lo primeiro, e de quebra pagar um “mico”, uma senhora gentilmente nos alertou de que não se tratava de Zuenir, e sim do escritor Ignácio de Loyola Brandão. Eu com toda a minha ignorância literária fiz aquela cara de “hãrã, sim, perfeitamente. Não estávamos falando sério”.
As horas passavam e parecia que Zuenir não chegava nunca. Queria tento falar para ele do livro, da minha naturalidade (sou acreana), falar das pessoas em comum que conhecíamos. Quem sabe ser do Acre fosse uma brecha para puxar assunto? Ainda mais com o cara, que escreveu com tamanho zelo a história do Chico.
Mas tinha um “mas” em toda essa história: eu não estava com o livro. Tentei persuadir a minha amiga a me dar o livro dela. Falei para ela que poderíamos autografá-lo juntas, mas nada a fez mudar de idéia. A minha vontade era mesmo na sua ausência roubar o seu livro, mas foi só uma pequena vontade.
Resolvemos circular pelo ambiente e encontramos uma amiga de faculdade. Ficamos as três, juntas, com papel e caneta na mão, aflitas, para variar eu roía as unhas. Tão meninas, tão focas, tão tietes... Na frente dele queríamos falar, manter um vínculo, que fosse apenas por alguns segundos, eu não nego a minha vaidade e comecei a falar pelos cotovelos. Nos apresentamos, falei para ele do livro, simulei para ele que a minha amiga o tinha pego de mim, da demora, da honra em conhecê-lo e mais um monte de bla,bla,blá. Tentei ser engraçada, não sei se consegui atingir o meu objetivo.
Tinha guardado o meu trunfo, o fato de ser acreana. A partir disso iríamos conversar sobre várias coisas. Enquanto isso Zuenir autografava, perguntava o nome e anotava. Na minha vez, antes dele perguntar o meu nome, falei a ele que era acreana. Ele autografou e nada mais.
Li rapidamente o que ele tinha escrito e sentei, pois a programação estava atrasada, o tempo era curto e Zuenir tinha que subir ao palco com o Brandão. Mas algo me remoía, tirei o autógrafo da mochila e li novamente. Não conseguia entender direito, com certeza não era “acreana”, pois tinha um “i” no lugar do “e”. Ele não escreveria errado. Preferia que tivesse escrito errado. Não consegui me concentrar muito no bate-papo, pois o “acriana” do Zuenir me vinha à cabeça constantemente. Mais tarde, já em casa, lendo e relendo descobri ser Adriana e não acreana.